domingo, 30 de janeiro de 2011

DE FRANCISCO A CHICO - Um Beija Flor do nosso cinema


Acabou na sexta-feira última a série Chico Xavier, da Rede Globo, uma extensão do filme de Daniel Filho que representa um dos grandes sucessos de nosso cinema.

Independente de minha atual curiosidade pela doutrina espírita - provocada justamente pela apreciação do filme - o interesse pelo filme enquanto produto artístico é inevitável. O filme é de um cuidado e rigor estéticos que deixam no espectador uma sensação de acolhimento, de respeito e interesse pelo público por parte de quem o produz. Acho que as inovações na construção das cenas - como a explosão das telhas na primeira psicografia, as imagens da estação de São Leopoldo - apontam para uma libertação dos modelos televisivos que dominam as produções da Globo Filmes.

Mas, se o roteiro do filme - adaptado da obra de Marcel Souto Maior - é uma preciosidade, se a direção é afinada e delicada, se as locações são de um apuro apreciável, nada se pode comparar ao trabalho do elenco, com seus famosos e desconhecidos fazendo um trabalho primoroso de interpretação. Christiani Torloni e Cássia Kiss formam uma dupla comovente. Tony Ramos sempre competente e carismático. Giovanna Antoneli soberba. Luiz Melo, Pedro Paulo Rangel, Osvaldo Mil, Carla Daniel, Letícia Sabatella, Giulia Gam e tantos outros se esmeram em construir um filme tocante. Nelson Xavier e o menino Matheus Costa fazem um Chico humano, amigo, querido.



Mas Ângelo Antônio... ah, este supera-se de forma apaixonante. Eu já o tinha nas contas de um dos maiores atores do nosso cinema desde Dois filhos de Francisco, onde, vivendo um outro Francisco, ele faz um trabalho visceral, que dá liga a todo o filme. Mas em Chico Xavier, realmente ele superou tudo o que havia feito até aqui. Seu comportamento corporal, suas expressões de rosto, seu sorriso, seu olhar, conseguem materializar toda a paz e amor que Chico Xavier emanava. Se Nelson Xavier parece-se incrivelmente com Chico, na dimensão física e material, é Ângelo quem traduz toda doçura, segurança e conforto que se reconhece no médium.

Por conta do impacto provocado na obra em mim, fui estudar a doutrina. Li Alain Kardec, assisti Nosso Lar (que acho um equívoco do ponto de vista estético) e estou assistindo ao programa Pinga Fogo (DVD com as duas entrevistas históricas do ano de 71 que estão em boa parte do filme). É impressionante a paz que a presença de Chico inspira, mesmo em vídeo. E é impressionante como vendo-o a semelhança com Nelson Xavier é grande, mas a gente percebe a qualidade do trabalho de Ângelo, pois é o Chico jovem que parece ser evocado, através da energia, do tempo da fala, do sorriso.

Ainda tenho minhas questões com a doutrina. Cheguei à conclusão que sou mais 'Chico Xavierista' do que Kardecista, pois me convoca muito mais o amor pregado por Chico Xavier do que as teorias que pra mim soam por demais classistas presentes no discurso do francês.

Votlando a assistir ao filme, porém (agora extendido em série, depois de eu ter assistido umas 6 ou 7 vezes antes) chego à conclusão que sou Ângelo Antonista. Que o que me convoca e me atrai - pelo menos o que serviu como ponto de partida para a experiência de pesquisa sobre o tema - é a experiência estética. Vendo Ângelo Antônio em cena, penso em como gostaria de fazer cinema (lembrem-se que sou atriz). Como é lindo dar vida a um personagem, a uma idéia, evocar multidões através de sentimentos, enfim, realizar uma viagem dentro da experiência humana de cada um através de um trabalho. Da dedicação de estudar, ler, pesquisar, fazer, doar-se, ser um outro alguém. Um trabalho desses requer dedicação, amor e me convece de que a produção artística é um trabalho sublime, especial, transformador.

Eu tenho muito orgulho de ser artista e espero que possa transformar vidas, tocá-las ao menos, como este filme (e tantas outras obras de arte, obviamente) fez comigo. Acho que estes artistas têm algo de especial por promoverem amor em quem os assiste e o encontro entre o tema do filme e sua realização prática, nem estão tão distantes assim.

Deixo então registrada minha profunda admiração pelo trabalho do ator Ângelo Antônio, que com maestria e delicadeza me levou para um novo lugar, me convocou a uma pesquisa da doutrina espírita e mais que isso, uma pesquisa de mim mesma. Neste ponto, doutrina espírita e experiência estética têm para mim um papel muito semelhante que é esta busca por respostas  dentro ou fora de mim. E Viva o espírito artístico! E Viva a encarnação da experiência estética!




http://www.chicoxavierofilme.com.br/


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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A NOITE DO TEATRO BAIANO



Já fez um mês o lançamento oficial do livro, mas eu vou comentar assim mesmo.

Meu querido amigo, o grande jornalista, pesquisador e escritor Marcos Uzel, lançou no vão do TCA, no dia 20 de dezembro de 2010 o seu mais novo livro sobre o teatro na Bahia. A NOITE DO TEATRO BAIANO é uma retrospectiva do Prêmio Braskem de Teatro durante os últimos anos, com todos os nomes que ele já teve: Bahia Aplaude (para mim o mais bonito), COPENE eo atual  BRASKEM.

Todos nós do teatro de Salvador, sabemos que a noite de entrega do Braskem é a noite do Oi (não da OI). Toda a classe está lá: os indicados e os que ficam lá na fila Z125 (ao pé do Caboclo do Campo Grande) perguntando porque ainda não e quando estarão nas filas A, B e C, como concorrentes e quem sabe um dia, lá em cima, como vencedores. Eu faço parte deste segundo grupo, viu gente... disfarça.

Mas, passada a dor de não ter sido indicado nunca, a gente curte a indicação dos amigos, o grande espetáculo a la Oscar que se apresenta para nós e o delicioso coquetel que todo aluno da escola de teatro se esbalda...

Mas, deixando a bobagem de lado, o livro é um importante registro sobre o que temos feito nestes últimos anos. Claro que ele não contempla todas as produções do período (as minhas por exemplo...) mas qual publicação realizaria tal milagre? Nenhuma, até porque ninguém jamais saberá tudo o que se faz de teatro nesta ou em qualquer outra cidade do mundo.

O belíssimo prefácio de Cleise Mendes fala da festa que é o teatro, relacionando-a com a festa da premiação. Em seguida, encontramos um valiosíssimo registro de datas, imagens, fatos e acontecimentos que marcaram as produções de 17 anos de teatro na Bahia. O ponto de partida é a premiação de cada ano e paralelo a isso vão sendo narradas histórias do ano em questão e de como se comportou o cenário soteropolitano. As considerações sobre os atores, diretores e demais profissionais do palco além dde considerações sobre as obras também representam um importante registro histórico de nosso teatro.

Na graduação e na pós em teatro, aqui em Salvador e acredito que em boa parte do Brasil fora do eixo RIO-SP, nos deparamos com a falta de publicações sobre nossa história, sobre nossos questionamentos, nossas pesquisas. Muitas coisas de qualidade estão sendo feitas no PPGAC (Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas) da UFBA, mas vamos e venhamos, quem lê dissertação e tese??? Precisamos mesmo de bons livros e de livros que venham de diferentes origens: da academia, da prática artística, da prática jornalística. Algumas pesquisas têm sido publicadas como a de Jussilene Santana, mas isso ainda é só o começo.

O livro de Uzel tem um impacto muito importante porque é um livro repleto de vida, de reflexões que partem de um cotidiano que nos diz respeito. Sua obra nos acolhe quando encontramos caras e fatos tão próximos de nós e ao mesmo tempo tão relevantes que nos assustam.

Estávamos acostumados a ver, em belas páginas de couché brilhante, fotos de ídolos, de fantasmas com os quais jamais convivemos. Parecia que a história só era possível assim, feita de fantasmas. E de repente, estamos lá, nós, nossos amigos, mestres, companheiros... num importante livro de História do Teatro.



Espero que Uzel continue publicando sobre teatro, como tem feito já há algum tempo, espero que a Braskem e outras empresas invistam mais nestas publicações e em outras iniciativas do tipo. Espero estar na próxima edição do livro sobre a premiação (rsrsrs), e espero que a gente continue fazendo teatro lindamente como temos feito há tanto tempo.

Espero que olhar no espelho seja tão bom como foi olhar para as telas da TV e do cinema durante tanto tempo. Espero que continuemos apostando na força criativa do povo baiano e que sigamos inventando o novo, seja reinventando o velho, seja explodindo estrelas...

Obrigada, Marquinhos, por tão lindo documento, cheio de sentimento e repleto de significado para nossa classe. Ele é um importante instrumento para registrar o que fomos, para apontaro que somos e para nos propor o que queremos, podemos e merecermos ser.

As fotos do lançamento são de Paulo Sousa  e eu peguei lá neste link:
http://www.bahiavitrine.com.br/ver_evento.aspx?eveid=5249








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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A SAÍDA DO SECRETÁRIO

Estava meio que sem assunto para retormar este blog, como já fiz com o de futebol. Mas, agora, dando uma voltinha na net, vi que os novos secretários de Wagner para o segundo mandato estão sendo indicados e achei um bom motivo para falar de teatro.

Eis que entre a lista dos secretários que vão permanecer não contém o nome de Márcio Meirelles, na Secretaria de Cultura. Isso, eu lamento muito. Talvez ele mesmo tenha pedido para não continuar, como já alguns me tinham cogitado no ano passado. O que não diminui os motivos para eu lamentar.

A gestão de Márcio foi, para mim, uma gestão digna da inauguração de uma Secretaria Estadual. Seu compromisso com a arte, seu talento e sua gentileza e simpatia, eu já conhecia. Sua competência na gestão do Vila também, mas sua coragem e sua força em enfrentar as adversidades foram para mim uma grande revelação. Não que eu não soubesse de sua vitória contra problemas graves de saúda na década de 90, mas aguentar o que ele aguentou da própria classe, foi realmente para mim, admirável. E ao lado da força com que conduziu a pasta, tenho que comentar também da classe e da elegância com que tratava seus detratores. Tive a honra de ir a algumas reuniões da classe e ver a forma como ele conseguia apagar alguns incêndios provocados pelos mais exaltados, que muitas vezes acabavam por fugir ao foco da reunião. Via e aprendia que manter a calma sem perder a autoridade que a situação permite e exige, é a melhor forma de continuar de pé, pronto para andar para frente.

Sua política de interiorização das ações da Secretaria e da FUNCEB foi definitiva para o avanço incomparável que temos nas cidades de nosso estado, sejam elas grandes ou pequenas. A disseminação dos Pontos de Cultura, os cursos oferecidos aos grupos de tantas cidades do interior, a realização das Conferências, o apoio aos atistas de rua e à Cooperativa Baiana de Teatro, os editais e sua divisão entre interior e capital, a chuva de Festivais que ainda rega nosso fazer teatral são marcas destes 4 anos de sua gestão.

Quero então, meu admirado Márcio Meirelles, torcer para que você continue na vida política, por mais que isso lhe seja um sacrifício, porque você fez seu dever muito bem e pessoas com esse talento têm a tarefa de ajudar na construção de um mundo mais justo. Você é corajoso, inteligente, de vanguarda e precisa estar nesse palco da vida política para que nós possamos continuar avançando.

Obviamente que cabe a nós também construirmos ao seu lado e ao lado dos demais batalhadores da cultura o cenário que desejamos. Mas a tarefa de enfrentar a burocracia, de fazer alianças e acordos, de recuar um passo para avançar dois não é coisa fácil e nem todo mundo tem o know-how. Assim, é preciso que ocupemos os lugares para os quais temos competência. De que adianta boa vontade, sem saber fazer? Sobretudo neste lugar tão ingrato que é o mundo político?

Espero que seu sucessor tenha olhos para o povo do interior como você teve. Espero que tenha sua coragem e sua delicadeza. Espero que tenha uma visão humanística da arte e artística da humanidade. Espero que faça uma grande gestão como foi a sua.

Espero ainda, que você tenha muita saúde e que sua vida profissional continue operando maravilhas como tem feito até aqui, para todos nós que temos o prazer de assistir às suas obras quer sejam elas artísticas ou políticas.

Obrigada pelos anos de dedicação à cultura e à arte na Bahia. Como atriz, professora de teatro, pesquisadora e espectadora eu só tenho a agradecer.

Grande abraço. Fique com Deus.



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