segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

UMA PRAÇA E UM VIOLÃO

Foi apenas disso que Dona Maria da Graça Costa Penna Burgos precisou para encantar ainda mais o natal de Vitória da Conquista.
"Onde o que eu sou se afoga!"

Eu nem sei direito por onde começar, ou mesmo o que escrever depois de tão linda experiência.

Ela entrou no horário marcado, com a delicadeza de diva. Aparentava  um certo receio, parecia acanhada e eu diria até que talvez tivesse exagerado na dose de Rivotril. No asfalto, nos perguntávamos qual seria o repertório. Ela escolheria as mais famosas ou cantaria as novas canções?

Na imensidão do pequeno palco, apenas um respeitável violão, com seu tocador a postos. E ela surge, elegante, toda de preto, com seus belíssimos e inconfundíveis cabelos negros, livres e autoritários!

Ela foi tirando da manga uma arsenal de encantos e aos poucos, o que não é novidade, foi ficando com a plateia na palma das mãos. A cada nova canção, a gente era mais escravo daquela voz que é um privilégio poder ouvir pessoalmente.

E atacou de Bossa Nova, de Chico Buarque de Caetano Veloso.

E a praça era um aglomerado de gente feliz, com os braços pra cima, olhando ora pra diva, ora pra os amigos, como se fosse fim de festa, todo mundo cantando junto, naquele calor humano que fez Conquista suar. Um céu lindo de estrelas cobria  festa.

A todo Vapor de 1971
E no meio dessa paixão mútua, sem excessos, sem desperdícios, as cordas do violão me dizem que ela vai entoar aquela poesia mágica e dilacerante de Wally Salomão.

Sim, nos primeiros acordes, os viciados já sabiam: lá vem Vapor Barato! Eu, em transe, fechei os olhos e aproveitei esse momento de contar pros netos um dia. Ela dominava aquela praça com apenas três armas: as cordas daquele impressionante violão, os versos do poeta jequieense e as vocalizes pelas quais ela será eternamente lembrada.

Eu me arrepiava e dizia: o mundo já pode acabar!

Eu só imaginava, ao olhar para aquela mulher iridescente, toda sua trajetória, toda a sua ousadia, beleza, vigor que durante tantos anos estiveram presentes nos palcos do mundo. Lembrava de todos os documentários e tapes de shows que assisti e sempre me vinha à mente a imagem daquela mulher magra de cabelos negros, com aquele sorriso agressivo e uma audácia contagiante e desconcertante. Uma estrela! E ao mesmo tempo, sentia-me tão feliz de minha filha de 14 anos estar ali, dividindo comigo essa experiência de se levar pra sempre. Aprendendo essa coisa toda de ser grande e de ser feliz, assim, só por ser artista! Um aprendizado!

Daí para o final da festa, tivemos Força Estranha, pra emocionar, Festa do Interior pra desopilar, e Gabriela pra lembrar que a gente é povo e que povo tem uma mania danada de ser feliz, contra tudo e contra todos!

Índia, álbum de 1973
Fico imaginando Gal Costa, a grande Gal Costa, intrépida, mulher ousada, bela como ela só, viajante do mundo, ícone de uma geração, agora mãe, madura, meio cansada, mas nunca menos diva, ali, naquele palco em plena praça na caatinga baiana, cantando para pessoas de diversas idades, classes sociais, gêneros, tribos. Senhorinhas na plateia, sentadas em frente ao palco ou amontoadas na frente, dançando como se nem lembrassem das restrições médica. Fico pensando o que é para essa mulher, artista do mundo fazer parte de um projeto deste, olhar pra frente e se deparar com tanta beleza, com tanta verdade e simplicidade.

Que o Natal da Cidade continue a promover belezas como essa, momentos de puro deleite e glória.

Obrigada, Gal Costa pela sua obra, pela sua elegância, pela sua luz! Obrigada pelo acertado repertório no mais puro estilo THE BEST OF... que foi um acerto sem precedentes. Conquista, em coro, lhe respondeu cantando, como num rito religioso, pois tudo que se viu naquela noite, pelo menos do pequeno pedaço de chão onde eu me encontrava foi o mais puro RELIGARE que se pode experimentar.

Feliz Natal, grande diva!


Feliz Natal, minha Gal!


Gal Costa e Luiz Meira ao violão em noite iluminada em Vitória da Conquista - Foto Vítor Nascimento


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