quinta-feira, 29 de setembro de 2011

BREVE espaço para o afeto

Ontem fui ver alguns amigos queridos no palco. É o espetáculo BREVE do diretor Thiago Romero e seu Teatro da Queda.

No começo estava bem empolgada com o clima que estava sendo construído com a plateia. Gostei muito da ambientação da sala de espetáculo, adoro linólio branco. Acho bonito. Só isso. Isso que é tanto e ao mesmo tempo tão pouco nesse universo de apreciação estética.

Achei a peça jovem. Talvez excessivamente jovem. Fiquei me perguntando por que os jovens fazem mais teatro que os maduros. Longas hipóteses e possibilidades.

O clima criado na peça me agradava e eu achava que uma experiência estética legal e descontraída estava sendo proposta ali. Por que não? Qual o problema nisso?

No entanto, a peça foi se redendo ao realismo e a um drama que eu julgo desnecessário. O que era uma promessa de um jogo entre elenco e plateia, tornou-se, ao apagar das luzes gerais, mais uma peça fechadinha, dentro de um jogo que se impunha mas foi abortado. E o teatro realista realizado no 'invés de' não foi suficiente para justificar a troca.

Acho que dava para ter radicalizado na proposta inicial. Ainda temos, como atores e diretores, medo dos riscos de envolver de fato a plateia no jogo cênico, e ficamos, na maioria dos espetáculos com interação, simulando uma participação do público, fazendo o público dizer aquilo que queremos ouvir, porque é mais seguro que ele nos diga isso.

Em vários momentos da peça, senti vontade de intervir, mas não havia no código criado ali espaço para minha interferência. Era como se dissessem: 'essa parte é teatro sério, não cabe sua participação'.

Queria dizer, por exemplo, que a cena do chilique de Duda Woyda não convence, por mais que os atores construam realistica e stanislaviskianamente a cena que era pra parecer verdade, mas que todo mundo sabia - eu acho - que era cena.

Eu já havia sentido esse mesmo incômodo com a peça que veio do Rio de Janeiro e que eu achei bem chata, com outro Duda, o Moscovski, a peça CORTE SECO. Um jogo pela metade. Um simulacro de jogo.

Eu sinto que a coisa de contar histórias pessoais, de infância, do cotidiano da casa viraram a cachaça da vez nos palcos brasileiros. Já vi isso em muita peças e eu mesma já fiz isso em Solo Compartilhada. Rastros do Teatro Essencial de Denise Stoklos. Mas, o modelo foi sendo reaplicado, sem mudanças, sem variações e sem críticas, talvez. Era lindo e poético quando era subversivo. Agora virou o padrão. E cá pra nós, nem todo mundo tem aquele tempo cênico de transformar lembranças em cena.

Mas, tem uma coisa HIGH TECH em Thiago Romero que eu gosto muito e tem uma vontade de fazer outras coisa que não teatro realista que eu acho louvável neste grupo. Se eles ainda estão engatinhando, que engatinhem, levantem e andem. De que serve pisar na cabeça da criança que engatinha?

Eu gosto da alegria e do colorido do projeto, desde a divulgação até o cenário, como já disse. Repito que o que me incomoda na peça é quando ela não confia naquilo que propõe e acaba por se trair, recorrendo a cenas realistas (e aquela coreografia modernosa que eu também não sou muito fã, mas enfim) como se estes recursos fossem necessários para legitimar aquela experiência como teatro.

Desde Arde que eu acho a poesia e memória da dramaturgia de Romero um pouco frágeis para serem levadas aos palcos. Gostaria, talvez, de ler seus textos. Mas, acho que ele pesquisa e experimenta e isso é coragem e vontade de fazer. Reconheço seu talento, sobretudo no campo da visualidade da peça. Adorei Córtex, que é muito visual. Acho interessante que Romero invista em atores que não são do circuito de queridinhos do palco soteropolitano que se contam nos dedos da mão. Acho que existe uma afetividade em seu trabalho, na equipe que trabalha com ele e isso pra mim, ainda é - e eu espero que seja sempre - fundamenal.

Quanto ao trabalho dos atores, acho que é difícil falar, porque eles operam num limite entre algo que poderia ser o espetáculo e o que ele acaba sendo. Como comentar sua performance? Do ponto de vista do desempenho na construção de personagens? Do carisma? Da expressão corporal? Mas também, o que podemos dizer de interpretações em época tão híbrida e de tantas provocações e possibilidades? Fica como qualidade, para mim, a disposição para tentar, para se descobrir. Só acho importante tentar fugir ao equívoco, à tentação de em considerando que se pode tudo, nada é nada. Se tudo vale, não tem porquê se esmerar em algo. Não que isso aconteça aqui, deliberadamente, mas em alguns momentos pode parecer um risco real.

Não acho que BREVE seja um acontecimento revolucionário do teatro, nem acho que era para ser isso. Acho que é um grupo experimentando uma linguagem, com coerência e dedicação. E não podemos negar que o Teatro da Queda tem um público cativo, sempre com casa cheia e isso não é pouca coisa. Talvez as críticas feitas à peça em outros espaços de análise não vejam como relevante o fato de se ter um teatro com temática ou estética jovem, adolescente talvez, levando gente ao teatro, mantendo jovens afeitos a um grupo específico servindo de importante entrada para o universo do teatro. Essa nossa mania de achar ruim tudo o que lota teatro, como se peça boa fosse peça para poucos.  Peça para os escolhidos, os iniciados, os especialistas, os bem dotados de intelecto e conceito. Coisa mais neoclássica (para não dizer cafona) impossível.

Acho que é isso.

Vejam bate-papo com THIAGO ROMERO, nosso primeiro entrevistado no DEZ MINUTOS COM... há algum tempo atrás. Tá lá no finalzinho da página. CLIQUE AQUI.

Acompanhe o blog do TEATRO DA QUEDA.


FICHA TÉCNICA

Concepção e Direção: Thiago Romero
Elenco: Duda Woyda, Guilherme Silva, Gustavo Nery, Karen Souza, Ricardo Albuquerque, Márcia Gil-Braz e Luiza Bocca
Figurino: Tina Melo
Cenário: Deilton José
Trilha: ZERO, Thiago Romero
Vídeos: Gustavo Nery

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