É bom que dá pra vocês lerem as postagens antigas, relerem as mais queridas e ficar na expectativa por um novo bate-papo.
Pois bem, tenho que dar uma paradinha na correria da vida uesbiana para escrever algo sobre o qual realmente não dá para não escrever.
Fazendo um dos jogos de Boal para aquecimento da plateia |
Como parte das comemorações pelos 30 ANOS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA, os três campi - Vitória da Conquista, Itapetinga e Jequié - receberam a presença do diretor, para um bate papo sobre o documentário exibido, que ainda entrará em circuito comercial. Infelizmente, como vocês podem ver, a plateia foi tímida, mas só em número, viu, porque o debate foi ótimo. Valeu por quem foi!
Eu e Zelito Viana |
Mas, vamos chamar o Boal para a conversa, né.
O documentário, como o próprio Zelito comenta no debate, era pra ser um filme sobre o Teatro do Oprimido. Sua equipe acompanharia o trabalho de Boal pelo mundo, aplicando suas técnicas, o que resultaria na obra planejada. Porém, todos foram (ou melhor, fomos) surpreendidos com a partida do teatrólogo no comecinho do trabalho, quando ainda estavam sendo feitas entrevistas para fazer o roteiro do filme. De posse das imagens captadas até ali, Zelito esperou diminuir a dor da família e dos amigos, e decidiu fazer um filme com as imagens que tinha. Na sessão de exibição do Rio de Janeiro a comoção foi total e toda a plateia chorou junta a saudade de nosso Augusto diretor e professor.
O documentário deverá ser um divisor de águas na relação em que temos no Brasil com o Teatro do Oprimido. Estudado e aplicado em praticamente todos os continentes do mundo, o método desenvolvido por Boal sempre sofreu de grande preconceito em nosso próprio país. Primeiro por nossa reconhecida síndrome de colonizado, que não nos permite valorizar nada que é nosso. Segundo por nossa aversão a temas e realizações populares, a menos que elas sejam abordadas de forma folclórica, exótica ou romanceada. Se é um método que serve a pequenas manifestações de teatro em comunidades, presídios, casas de saúde mental, acampamento do MST, deve ser tratado do ponto de vista antropológico, e certamente, seu valor estético se reduz diante de sua função social, certo? Errado. Bela merda esse discurso que se reproduz ao infinito dentro das academias e dos programas de pós graduação espalhados pelo nosso país. Tanto a aprender ainda temos! Mas, enfim, deixa eu me acalmar aqui. Não posso negar que este quadro está mudando e repito, este filme será uma importante ferramenta neste processo.
O próprio Zelito diz que o filme ficou didático porque ele mesmo estava aprendendo sobre o método, já qu enão o conhecia diretamente, apesar de ser muito amigo de seu criador. Quando perguntado sobre a motivação de fazer o filme, ele diz que a admiração por Boal foi a porta de entrada. Boal, segundo ele, era um homem encantador, que acreditava na mudança da humanidade, da sociedade e que essa crença não era algo utópico, mas bastante concreto e contagiante. O lema de Boal, segundo seu amigo, era "cabeça nas nuvens, pés no chão e mãos à obra"! Isso chamava sua atenção!
O documentário, devo concordar com seu autor, é didático, mas para o bem e não como um defeito. Ele introduz o iniciante nas mais elementares informações sobre o método, mas vai muito além, trazendo depoimentos de pessoas dos mais diversos países, das mais diferentes culturas que aplicam o TO na luta contra as mais diversas e impensadas opressões. Para quem já conhece o método, como era o meu caso, pois eu já passei pela formação do TO através do Programa Ponto de Cultura e também porque estudo sua obra já há quase uma década, fica aquela certeza de que é de fato um grande método, que contribui para a prática de teatro, seu ensino e aprendizagem sua interferência contundente na sociedade.
E para quem gosta tanto de padrões internacionais para medir aquilo que presta e o que não presta, o trabalho de Boal ao redor do mundo compara-se, em importância e genialidade, ao trabalho de Stanislavski e Brecth. Para fechar o caixão da questão, basta dizer que a Royal Shakespeare Company o chamou para dirigir seus atores, para que eles se aproximassem de fato de Shakespeare e seu princípios de teatro popular. Deu, né?
A tempo: um grande abraço ao parceiro Esmon Primo, que com muita garra tem peitado boas brigas pelo cinema na uesb e na região. Abraço, querido, é muito bom trabalhar com sua euqipe!
Assim que souberem deste filme nos cinemas, não deixem de assistir. Quando sair em DVD não deixemos de invadir as escolas, associações, comunidades, famílias com esse material de importância ímpar para nossa prática teatral. E quando tiver um filme de Zelito Viana em cartaz, ou nas locadoras, não deixem de ver. Esses brasileiros são realmente figuras com as quais vale a pena estar por perto. Se não dá para estar perto deles pessoalmente, que estejamos com o melhor que eles têm: sua arte!
Confiram os trailers enquanto aguardam pelo filme: