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Espero que gostem:
A BELEZA DE ONDE VIEMOS
Quando eu era adolescente eu era bem magra, os cabelos bem cheios e cacheados, praticamente um cogumelo. As pernas finas como uma seriema. Tinha a voz estridente, falava muito e muito alto. Falava rápido e andava devagar. Ouvia constantemente: “Fala baixo, menina” ou “Anda rápido, menina”. Mas, no fundo meus maiores problemas eram meu grande nariz avantajado e minha boquinha pequena e afinada. Na frente do espelho, eu puxava e repuxava o nariz pra tudo que era canto, tentando fazê-lo ficar menor, mas nada. E sonhava com aquilo que me tornaria a pessoa mais feliz do mundo: uma cirurgia plástica no nariz. Eu só esperava ter idade – e dinheiro – para realizar este sonho. A idade viria, eu estava certa. Já a grana...
Os
anos foram passando, eu saí de casa aos 15 anos e fui me encontrando em
situações que me revelavam muito mais do que o espelho. No colégio interno onde
fiz o ensino médio, se encontravam dezenas de adolescentes de diferentes partes
do estado da Bahia (Colégio Técnico da Fundação José Carvalho, em Pojuca) e a
profusão de sotaques e prosódias me levou a uma forte descoberta: Sim! Eu tinha
sotaque! É, porque até ali, eu achava que todo mundo tinha sotaque, menos os
conquistenses. Claro, eu nunca tinha confrontado meu sotaque com outros.
Primeira descoberta de traços de identidade, sem, ainda ter noção dessa
experiência.
Mais
adiante, assisti a uma matéria de jornal na TV que tratava de traços físicos de
identidade. Uma moça, com um nariz grande como o meu, dizia, feliz, ao
repórter: “Eu sei que meu nariz é grande, se comparado à maioria, mas isso não
me incomoda. Esse nariz me diz das minhas origens, me diz dos povos dos quais
herdei traços e comportamentos. Mexer nesse nariz, seria negar minhas origens.”
Claro que não foi exatamente assim, porque eu não seria louca de decorar uma
fala na TV por tantos anos. E claro que ela não estava fazendo um tratado
contra cirurgias plásticas. Mas trago este exemplo, porque neste momento,
lembro-me de ter me levantado, ido ao espelho e pela primeira vez em
aproximadamente 18 anos, ter sido simpática com meu nariz.
Isso
porque eu já desconfiava que a família do meu pai apresentava fortes traços
árabes. Na verdade desconfiei porque muita gente perguntava e julgava evidentes
os traços em meu rosto. Já aos 20 anos, em São Paulo trabalhando numa grande
rede hoteleira praticamente todos os hóspedes europeus perguntavam de onde eu era,
sempre esperando um lugar do Oriente Médio e se espantavam (e até se
decepcionavam) quando eu dizia: Vitória da Conquista, interior da Bahia.
Hoje,
muitos anos depois, estou de volta ao lugar onde nasci. De volta para ficar (eu
acho) e jamais poderei traduzir em palavras o que é voltar para o lugar ao qual
pertenço. Indo ao Distrito de origem da família de meu pai (José Gonçalves,
conhecido como Guigó – eu nunca tinha visto um lugar ter apelido) eu vejo
tantos, mas tantos traços parecidos com o meu. Tantos narizes grandes e bocas
pequenas e – pasmem – sinto uma grande alegria nestes que outrora eram meu
grande problema estético. Alegria, porque me identifico com aquelas pessoas,
porque me encontro com minhas origens, meus princípios e entendo tanto de mim
mesma. Fico curiosa porque gostaria de pesquisar sobre a influência árabe neste
pedaço de Caatinga no Sudoeste da Bahia. E entendo que era preciso eu viver
essas quase quatro décadas para entender e viver este sentimento.
Ouço
as canções de Elomar Figueira Melo, a voz encantadora de Xangai e meu coração
se alegra, porque sei que suas canções, letras e melodias falam da terra de
onde vim. E, depois de tantos anos cruzando o Brasil, trocando de endereço,
profissão, cidades e estados, volto para o lugar onde vivi boa parte de minha
infância. Percorro as mesmas ruas e a memória me aquece.
O
lugar de onde viemos, quer seja o lugar físico ou o lugar simbólico (a família,
os amigos, as associações, escola, igreja, coral) é um importante e belo pedaço
da gente que às vezes abandonamos ou, pelo menos, negligenciamos. Um retorno
delicado às nossas origens pode ser aquilo que nos falta em momentos onde temos
aquela sensação de estarmos perdidos, soltos no universo, sem eira nem beira,
sem perspectiva. Talvez esteja na volta ao passado, a reconstrução segura do nosso
futuro.
Reencontrar
pessoas que apresentem traços físicos semelhantes aos nossos, muitos ou poucos
(um sorriso largo, uma perna bem torneada, uma sobrancelha farta) pode ser um
acolhimento silencioso que o outro nem sabe que está fazendo, mas que estando à
nossa frente, lembrando traquinagens do passado, ou perguntando por aquele
fulano de quem nunca mais se teve notícia, nos diz afetuosamente: “Você não
está sozinho”.
Agora,
se neste encontro com familiares e amigos pintar a sessão álbum de fotos, se prepare
porque o riso e as lágrimas vão ter presença garantida. Fotos que a gente
jamais se lembraria de ter tirado. Pessoas ao nosso lado que a gente se quer
lembrava que existiam. Lugares que nem existem mais. Árvores que viraram
prédios. Praças que viraram estacionamentos. Está tudo lá, vivo na fotografia,
registrado na memória, preso a um passado idílico, um passado perpétuo que nos
configura e nos fortalece.
Garanto
que voltar ao espelho depois de reencontrar os seus, será uma experiência
reveladora. E se você fez uma plástica ou outra, não se sinta menosprezado por
este artigo, pois não estou necessariamente falando de traços físicos (envelhecemos,
e isso não deixa de ser uma mudança). Há lago neste espelho que agora te olha,
que bisturi nenhum tira e que só os seus olhos poderão reconhecer. Não precisa
dizer pra mim, nem pra ninguém da alegria de se sentir parte de uma família, de
um grupo de amigos, de um passado coletivo. Basta valorizar o sorriso que com
certeza virá te visitar assim que você colocar a cabeça no travesseiro, nesta
noite que talvez seja a primeira dessa sua nova fase, desse seu novo futuro. E
por falar nisso, feliz 2012 para todos nós. Que ele seja assim, simples,
inusitado e belo, serenamente belo.
Amo!
ResponderExcluirBelo texto. Um carinho n'alma.
ResponderExcluirObrigada, amores.
ResponderExcluirO OLHAR DE YOLANDA
ResponderExcluirEntre eu e você
Existe um enorme abismo
Que precisa ser vencido
Com diálogos e confissões.
Quando estou só
Sinto falta do seu olhar,
Quando estamos juntos
Sinto falta de nos comunicarmos.
Mantenho ardentemente a esperança
De um dia tê-la em meus braços.
Conectar-me com seu corpo
Em tortuosas ondas de rádio.
A Timidez uniu-se ao Coma
Gerando tempestades cerebrais,
Impedindo a nossa aproximação.
Quero gritar ao mundo que a amo,
Mas como posso fazê-lo
Se os seus olhos insistem me negar?
Terei que fazer meu papel de bobo
Ou atuar como um desentendido?
De repente...
A sirene do intervalo tocou
Despertando-me de um sonho distante.
Tão distante, mas próximo do teu olhar
...Yolanda.
*Este poema é parte integrante do livro (O Anjo e a Tempestade) do escritor Agamenon Troyan.