domingo, 10 de abril de 2011

A VOZ DO CAMPEÃO. Vi e quero comentar!


Bom, vamos lá bater aquele papo sobre A Voz do Campeão. A princípio não vai ser um bate-papo, porque só eu vou escrever, mas os comentários estão livres e eu vou adorar conversar sobre.

Eu demorei de ir porque Casa do Comércio pra mim é longe que dói. Eu havia falado pra Edvard: "O único teatro longe que eu frequento é Pituaçu." E ainda bem que eu não sabia que vinha para a Sala do Coro, senão eu acho que não teria ido. Ninguém merece a Tancredo Neves. Mas, enfim. Futebol, Teatro, Edvard (com quem já trabalhei na área da educação e cujo espetáculo As Aventuras do Maluco Beleza eu adorei) Narcival (outro querido)... tive que ir.

Quando o espetáculo começou, confesso que fiquei um pouco tensa. Apesar da força e do carisma de Narcival Rubens, achei que nos primeiros 10 ou 15 minutos o espetáculo estava excessivamente didático. Fiquei com medo de ele ser todo assim. Achei a encenação fria e o texto pesado. Parecia que seria apenas uma descrição da trajetória do clube, ainda que a dramaturgia se esforçasse em colocar esta história inserida numa história particular do personagem, ou melhor em sua história familiar.

A partir do ano de 1959, no entanto, as coisas começaram a mudar. Além de extremamente tocante do ponto de vista ideológico, a cena dedicada à conquista da primeiro título brasileiro de futebol, contra o favoritíssimo Santos de Pelé, deu um gás ao espetáculo. Narrativa e encenação pareciam finalmente ter se encontrado.

A partir deste ponto, Narcival engata, com a ajuda dos vídeos maravilhosos do acervo de Álvaro Brandão.( http://www.futebolmultimidia.com.br/ ). A simulação do jogo histórico com imagens do PES (Pro-Evolucion Soccer - um jogo para Play Station) acompanhada da narração em rádio é muito boa. A platéia se envolve, grita, torce, ri e chora (os mais apaixonados) e toma conhecimento da importante história do Esporte Clube Bahia ao mesmo tempo em que acompanha a história da família 'Bira'.

É inusitado comentar uma peça dessa natureza. Ela tem indiscutíveis pontos positivos, pois leva para cima do palco a história de um time. De acordo com Edvard, esta parece ser a primeira produção no país neste sentido, de organizar, sistematizar e dramatizar, por assim dizer, a vida de um clube de futebol.

Também é desejo do diretor trazer para o palco o personagem que ele julga principal no futebol: o torcedor. Por isso, a opção por focar a dramaturgia nesta figura, ainda que se passe em revista a história de um clube (Confira bate papo com diretor e ator em: http://artedoespectador.blogspot.com/p/dez-minutos-com.html, neste mesmo blog).

Neste ponto, apesar de compreender conceitualmente a ideia do monólogo, eu acho que o espetáculo acaba carecendo de algo mais. Eu compreendo e gosto da ideia das três gerações e admiro sobremaneira o trabalho e carisma (repito) de Narcival, mas sinto que talvez um elenco maior pudesse dar vazão para outras experimentações cênicas. Sei que esse papo de comentar o que viu com base no que queria ter visto é um saco, mas enfim, comentário de peça não precisa ser um chá de comadres, né.

Tem uma coisa muito boa que eu acho que é a proposição de imagens. Os uniformes que o time teve ao longo destes 80 anos entram como uma peça esteticamente fundamental, mas acho que o impacto visual deste elemento não consegue impregnar os demais. Acho que eles desistem dos uniformes que, para mim, têm uma potencialidade cênica ainda a ser esgotada. O que havia me impressionado em As Aventuras do Maluco Beleza era justamente que a coisa toda de Raul Seixas estava na encenação e não apenas na dramaturgia. Isso eu acho que não aconteceu plenamente em A voz...

A arquibancada como elemento cênico, por exemplo, é genial, mas se perde ao meu ver, quando vira curinga da cena, servindo de um bocado de outra coisa. Conceitualmente eu entendo, mas cenicamente acho que não se resolve plenamente.


Outro detalhe que eu considero que atrapalha a proposta do cenógrafo Rodrigo Frota, é a qualidade do materia usado em cena. Para quem assiste é estranho ver um espetáculo patrocinado pela Le Biscuit e pela OAS (umas das patrocinadoras do Esporte Clube Bahia) usar TNT no fundo do cenário. O resultado é um azul fosco, quase transparente, que não combina com o azul da bandeira do time. Também os adereços que compõem a arquibancada me parecem um pouco pobres, contrastando com o material de algumas peças do figurino de Miguel Carvalho. Acho que os elementos cênicos acabam variando entre o 'apurado' de uns e o 'descuidado' em outros, o que provoca uma variação na unidade da cena.

Senti falta, meu amigo Edvard, da história da criação do hino. Fiquei esperando ansiosa por este momento. Mas, obviamente cada espectador poderá dizer que sentiu falta de um ou de outro detalhe, de um ou de outro jogo, deste ou daquele jogador histórico... É porque, como no próprio futebol, temos sempre um pitaco para dar. No teatro, pitacos não são lá muito bem vindos, mas no futebol, ah, eles são o que alimenta a paixão e a relação da torcida com o jogo.

Na saída do espetáculo, a platéia emocionada e não tem como ser diferente. O espetáculo é corajoso porque opta por um tema extremamente popular, porque não faz política da boa vizinha tratando do BA X VI e, sem medo de magoar rubro-negro, faz declaradamente uma homenagem ao Esporte Clube Bahia. É correto na dramaturgia, escolhe um caminho para seguir - e segue - mesmo que cada um de nós possa apontar outros mil caminhos que talvez tivéssemos seguido. Mas não seguimos.

Eu tô aqui sentadinha no conforto do meu blog, falando do produto de alguém que corajosa e laboriosamente idealizou, pesquisou, experimentou, projetou, captou, produziu, ensaiou, estreou e continua batalhando. E mais do que isso, um ótimo produto.

Amo a dedicação irrestrita de Narcival Rubens, sua entrega física e emocional ao personagem e ao espetáculo como um todo. Olho para o fundo do Dique junto com ele, e vibro com o título sofrido de 1979. Emociono-me com as estrelas que brilham em nossa bandeira e que emocionaram meus pequenos.

Eu estava comentando com Alam sobre estas questões das quais falo agora e Hannah manda uma real pra gente:

- "Vocês são dois chatos. O espetáculo é perfeito!"

Até a gente explicar que também adoramos o espetáculo, mas estamos falando de questões técnicas do fazer teatral, ela já nos virou as costas e foi cuidar da vida.

João, então, nem se fala. Até homenageado no final ele foi, por sua empolgação e participação durante o espetáculo. Sentiu-se em Pituaçu.

O espetáculo é um primor, deve ter longa vida porque ainda está achando a pegada certa para divulgar entre os milhões de torcedores do Bahia que podem, devem e hão de ir assisti-lo. Estou feliz com o espétáculo e acho que temos muita coisa a fazer da relação de teatro e futebol, enquanto tema ou mesmo enquanto vivência espetacular. É só um começo. E que belo começo.

Conversamos com algumas pessoas na saída da platéia, mas infelizmente a qualidade de áudio e imagem ficou muito ruim. Estamos tentando editar para tirar o ruído e se conseguirmos juro que posto aqui depois. Vamos ao bate-papo? Escreve aí o que você achou do que eu achei!!!

A VOZ DO CAMPEÃO
FICHA TÉCNICA:

Texto: João Alfredo Reis e Edvard Passos
Direção: Edvard Passos
Assistente de Direção: Norma Santana
Elenco: Narcival Rubens
Cenografia: Rodrigo Frota
Figurino: Miguel Carvalho
Uniformes de Época: Paulo Borges
Adereços: Maurício Pedrosa
Iluminação: Irma Vidal
Coreografia: Norma Santana
Pesquisa de Imagens: Álvaro Brandão

2 comentários:

  1. Drica!

    Foi emocionante ter sua linda família reunida e uniformizada conosco. Fiquei muito feliz com sua presença marcante que deu um brilho especial a nossa última sexta feira tricolor.

    Muito obrigado pelas palavras, querida. Muito obrigado pelos generosos elogios e muito obrigado também pelas críticas, que tenho certeza que vem do desejo de contribuir para o bem desse trabalho, que tanto tem conexão com você.

    Concordo com suas observações, sobretudo com as que se referem aos uniformes. adoro aqueles uniformes. briguei muito por eles e ainda labuto para tirar melhor proveito deles.

    Me permita discordar da observação da arquibancada. Gosto da idéia da arquibancada ser tudo, ser curinga, ser tudo pra Bira.

    Mas sobretudo, gosto muito do adjetivo corajoso presente repetidas vezes no seu texto. Acredito que esse é o espírito da empreitada, a coragem. Coragem de falar da paixão de tantos, coragem de experimentar levar pro palco a história de um time de futebol. Coragem de avançar de peito aberto até um público que não costuma frequentar o teatro e abrir caminho. É isso que vejo nos olhos de Narcival quando ele está em cena e é esse o Bahia que me interessa falar. O Bahia da coragem, das causas impossíveis, arredio, imperfeito, muitas vezes malacabado, mas com sangue nas veias.

    A boa notícia é que algumas das suas observações já estão sendo trabalhadas a exemplo da história do hino, que até estava em uma das versões do texto, mas que acabei tesorando na dura tarefa de sintetizar 80 anos em 80 minutos. As outras observações estão registradas e pensarei nelas com carinho.

    Um grande abraço pro meu amigo Alam, um beijão pra Hannah (estava torcendo para que ela gostasse do mesmo jeito que curtiu Aventuras!) e tenha certeza que não vou esquecer da imagem de João pulando pra abraçar Narcival no palco como um jogador comemorando um gol de final de campeonato.

    Valeuzão, Drica!

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  2. Obrigada pelo retorno, querido. Fico feliz que tenha gostado. Agora é esperar o retorno para divulgar.

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